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O PILÃO
Em nossa residência no
sítio Carnaúbas, de doce e inesquecível lembrança, havia bem ao centro da cozinha,
milimetricamente fincado ao solo e de forma equidistante às quatro paredes de tijolo
de adobe, um possante pilão de madeira adaptado de um tronco de árvore milenar,
possivelmente de aroeira ou similar com a cavidade no miolo em forma de bacia.
A dita árvore, extraída convenientemente dentre outras tantas
existentes no alto matagal das terras do Jaburu, no precioso sertão
varzealegrense, transformou-se em utensílio doméstico de comprovada utilidade e
resistiu por várias décadas, sucumbindo tão somente junto à demolição do
casarão.
Era usado por mãos fortes e bem treinadas.
Semanalmente, as filhas de Pinino, falecido esposo de
Antônia, Nazaré e Mundinha vinham da Lagoa de Dentro pilar arroz para o consumo
de algumas semanas. Essas três máquinas,
de forma conjunta e numa cadência impressionante. Não havia naquela época as
atuais máquinas de pilar contudo, elas faziam as vezes com absoluta precisão.
Era tão preciso e eficiente o serviço que ao chegar ao término da operação,
elas peneiravam o produto e dalí escapava apenas alguns caroços em casca que
eram chamados “ESCOLHAS”, por elas mesmas cuidadosamente separadas e
eliminadas.
Em verdade era um serviço ao qual se podia considerar
“braçal”, mesmo assim, e o mais
curioso, é que a remuneração não excedia a uns míseros trocados, senão, uma
rapadura e uns punhados de farinha. O suficiente mesmo era a “bóia”.
Tudo passou. As bravas meninas, acredito, já não existem
mais, tenho minhas dúvidas, porquanto, há muitos anos estou afastado daquelas
plagas que foram berço de minha saudável juventude e de lá quase não tenho
notícias. Restam muitas saudades e doe-me a certeza de que poucas, muito poucas
pessoas sobreviveram para comprovar as minhas lembranças.
Escrevo estas recordações para não deixar que tudo se vá com
o tempo, como também, em busca de algum leitor que possa estar ao meu lado e
compartilhar meus sentimentos.
Então, assim sendo, adeus meninas do pilão, adeus casarão,
adeus restos daquele tronco de aroeira e da capoeira, onde nasceu, cresceu e
emprestou utilidades em outras áreas diversas.
João Bitu
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